Thomas Mann A montanha Mágica. Título original: Der Zaljberiberg.

Comentário sobre o Livro.
Ler “A Montanha Mágica” é aprender a morrer. Quem vive está morrendo um pouco, e nessa montanha se vive muito devagar. Narra-se a história de Hans Castorp, um jovem sem muitas qualidades, que o autor apenas não quer chamar de medíocre. Estava um pouco esgotado, ao término de seu curso de engenharia. Antes de assumir um alto cargo na firma dos parentes, vai para um sanatório na montanha para repousar por quinze dias, com o pretexto de visitar o primo tuberculoso. Os médicos descobriram que ele trazia a doença embutida, e fica interno também. Então opera-se uma transformação nele, paulatinamente, à medida em que vai vivendo nesse lugar em que parece que o tempo não existe. No breve retrospecto de sua vida pregressa, é interessante notar o paralelo entre sua biografia e a de Thomas Mann, que também ficou sem pai (distante, no Brasil) e, embora tivesse a mãe, entregue à indiferença dos parentes. Falando no paralelo biográfico, vamos notar já o inacreditável capítulo sobre o passeio na praia – isto na montanha, num lugar que vivia coberto de neve, mesmo no verão – como se a mãe do autor, brasileira, de Paraty, deixasse nele esse sentimento atávico do mar. Vai conhecendo os hóspedes da clínica, que parece não terem nada de extraordinário. São de fato pessoas comuns que pegaram uma doença incurável, na época, e convivem com ela da melhor maneira possível. Quanto melhor é essa convivência, quanto mais parecem normais, mais ganham profundidade psicológica, mais vamos conhecendo quanto de humano pessoas comuns carregam dentro de si. Como não poderia deixar de ser, há a discussão religiosa – na pessoa de duas das personagens mais interessantes, mais complexas, um escritor e um jesuíta, dois pândegos a princípio, que vão crescendo e dominando a cena. É a cidade de Deus e a cidade dos homens em luta, ambas carregadas de erros, tentando justificar-se e impor-se. O desenlace dessa disputa será o clímax do romance. Sem vencedores, mas com perda e desengano. No entanto, a vida continua. Hans Castorp conhece ou pensa conhecer o amor. Não percebe que quem vive nas suas condições não tem direito de amar. Como se dissesse que quem vive nas condições em que todos nós vivemos a vida não tem direito a amar. É às vésperas da 1ª Guerra Mundial, quando o mundo vai transformar-se. Hans Castorp amadurece de repente – isto é, falamos que ali o tempo não existia, mas é tão vagarosamente que se passam as transformações nas pessoas que, quando vêem, já são outras. Como se fosse de repente. Nada poderia ser de repente num livro de 800 páginas. Nada poderia ser mais surpreendente num livro de tantas páginas, em que não acontece nada, e que nos deixa presos àquele mundo cheio de humanidade, que sangra sem que se perceba, que morre – e olha-se com galhardia a morte –, enquanto vamos-nos enriquecendo interiormente. Não é apenas Hans Castorp que cresce ao longo do romance. Não são apenas as personagens – sem grandeza como nós – que crescem ao longo do romance. Nós também. origem: A Montanha Mágica Thomas Mann. Éverton Luis Theobald .’.

Para a reflexão...
Sempre é válida a leitura deste texto, que nos remete uma profunda reflexão sobre o tempo. O real proveito do nosso tempo. Muitos podem estar pensando na questão de acumulação de objetos, cultura, entretenimento, diversão, enfim, tantas portas tangentes para nos esquivarmos do tempo.
Contudo Mann nos coloca de uma forma real, concreta e objetiva o que e como se faz o tempo realmente passar, o tempo ser uma mera ilusão, e o tempo por vezes parar, ou até se esvair no ar, pois na filosofia antiga se comunga de que só há um tempo, o presente, pois as ilusões, fantasias, medos estão baseadas em fatos do tempo passado com projeções do futuro realçadas na ansiedade social, e depressão. (ansiedade é rápida, e depressão é lenta.)
Contudo, para o melhor entendimento, Segue o Excerto da Montanha Mágica por Thomas Mann, onde este faz uma dissertação sobre a passagem lenta e rápida do tempo:
“Com respeito à natureza do tédio encontram-se freqüentemente conceitos errôneos.
Crê-se em geral que a novidade e o caráter interessante do seu conteúdo "fazem passar" o tempo, quer dizer, abreviam-no, ao passo que a monotonia e o vazio estorvam e retardam o seu curso. Mas não é absolutamente verdade.
O vazio e a monotonia alargam por vezes o instante ou a hora e tornam-nos "aborrecidos"; porém, as grandes quantidades de tempo são por elas abreviadas e aceleradas, a ponto de se tornarem um quase nada. Um conteúdo rico e interessante é, pelo contrário, capaz de abreviar uma hora ou até mesmo o dia, mas, considerado sob o ponto de vista do conjunto, confere amplitude, peso e solidez ao curso do tempo, de tal maneira que os anos ricos em acontecimentos passam muito mais devagar do que aqueles outros, pobres, vazios, leves, que são varridos pelo vento e voam.
Portanto, o que se chama de tédio é, na realidade, antes uma simulação mórbida da brevidade do tempo, provocada pela monotonia: grandes lapsos de tempo quando o seu curso é de uma ininterrupta monotonia chegam a reduzir-se a tal ponto, que assustam mortalmente o coração; quando um dia é como todos, todos são como um só; e numa uniformidade perfeita, a mais longa vida seria sentida como brevíssima e decorreria num abrir e fechar de olhos.
O hábito é uma sonolência, ou, pelo menos, um enfraquecimento do senso do tempo, e o fato dos anos de infância serem vividos vagarosamente, ao passo que a vida posterior se desenrola e foge cada vez mais depressa, esse fato também se baseia no hábito. Sabemos perfeitamente que a intercalação de mudanças de hábitos, ou de hábitos novos, constitui o único meio de manter a nossa vida, de refrescar a nossa sensação de tempo, de obter um rejuvenescimento, um reforço, um atraso da nossa experiência do tempo, e com isso, a revolução da nossa sensação da vida em geral.
Tal é a finalidade da mudança de lugar e de clima, da viagem de recreio: nisso reside o que há de salutar na variação e no episódio. Os primeiros dias num ambiente novo têm um curso juvenil, quer dizer, vigoroso e amplo - seis ou oito dias. Depois, na medida em que a pessoa se "aclimata", começa a senti-los abreviarem-se: quem se apega à vida, ou melhor, quem gostaria de apegar-se à vida nota, com horror, como os dias começam a tornar-se leves e furtivos; e a última semana - de quatro, por exemplo - é de uma rapidez e fugacidade inquietante.
Verdade é que a vitalização do nosso senso de tempo faz-se sentir para além do interlúdio, e desempenha o seu papel ainda quando a pessoa já voltou à rotina; os primeiros dias que passamos em casa, depois desta variação, afiguram-se-nos também novos, amplos e juvenis, mas somente uns poucos: porque a gente acostuma-se mais rapidamente à rotina do que à sua suspensão, e quando o nosso senso do tempo está fatigado pela idade, ou nunca o possuímos desenvolvido em alto grau - o que é sinal de pouca força vital - volta a adormecer muito depressa, e ao cabo de vinte e quatro horas já é como se a pessoa jamais tivesse partido e a viagem não passasse de um sonho de uma noite”.
Senhores, neste pequeno trecho do livro "a montanha mágica" de Mann encontramos a idéia que se expande em todo o romance. Ao lê-lo senti um arrepio, fruto da recordação dos maravilhosos momentos que me foram proporcionados durante a já longínqua cumplicidade que se estabeleceu entre o meu assombramento e as sucessivas palavras deste grandioso romance.
Com ele aprendi algo acerca do eterno e "estático" decorrer de todas as unidades de tempo, sejam elas segundos, horas, dias, meses ou anos. Creio que com a leitura deste romance, a nossa relação com a vida e a sua inserção no decorrer do tempo, inúmeras vezes incongruente e descabida, torna-se muito mais sincera e benéfica para o nosso bem estar físico, presente e metafísico.
Quem não leu ainda A Montanha Mágica, está deixando o tempo se esvair como a areia escapa de nossos olhos no deserto com o sopro do vento voraz.

Éverton Luís Theobald.'.



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